A Educação Moral Pode Ser Fundamentada no Naturalismo?
Gordon H. Clark
Entre as prescrições morais, a opinião comum incluiria o sexto, sétimo e oitavo mandamentos. Não matarás, não adulterarás e não furtarás são geralmente consideradas leis morais importantes. Um cristão ortodoxo ou judeu ortodoxo pode sincera e consistentemente inculcar essas leis porque crê que são leis de Deus. Elas são corretas porque Deus as ordenou E são leis porque Deus impôs penalidades à sua transgressão. Dessa forma a educação moral pode ser consistentemente baseada na religião bíblica.
Obviamente o humanismo, naturalismo ou ateísmo não tem esse fundamento para a moralidade nem aceita uniformemente essas leis. O professor Edwin A. Burtt, ele próprio um humanista, demonstra em ambas as edições de seu Types of Religious Philosophy um repúdio à moralidade bíblica ao registrar que os humanistas mais radicais consideram o “sexo um prazer essencialmente inofensivo que só deveria ser regulado pelo gosto e preferência pessoais”. De maneira parecida, o radicalismo político de muitos naturalistas ao atacarem a propriedade privada e advogarem a tributação de confisco e a redistribuição de riqueza é uma defesa mal disfarçada do roubo legalizado. E não é difícil identificar governos ímpios que fazem constante uso do assassinato. O naturalismo, portanto, parece ser consistente com um repúdio dos Dez Mandamentos.
Sem dúvida, muitos humanistas nos Estados Unidos desaprovam a brutalidade e o assassinato que são inerentes ao comunismo. Alguns até podem ter uma palavra amiga em relação à propriedade privada. E alguns não aceitariam o adultério. Mas o problema que o naturalismo deve enfrentar é este: pode uma filosofia empírica, uma filosofia que repudia a revelação, uma filosofia instrumentalista ou descritiva, fornecer um fundamento, não digo para os Dez Mandamentos, mas para qualquer prescrição moral, seja qual for? Ou será que os argumentos dos humanistas que colocam as relações sexuais na esfera da pura preferência pessoal também implicam que todas as escolhas da vida são igualmente uma questão de gosto pessoal?
Na axiologia, o método empírico só pode começar com a descoberta, na experiência, dos chamados valores. Arte e amizade, saúde e conforto material, são frequentemente identificados assim. A identificação precisa, contudo, não é o ponto crucial. Esses ditos valores são todos fatos descritivos. Burtt descobre na sua experiência uma preferência pela arte e amizade. Outra pessoa poderia não valorizar a arte. Do mesmo modo, a preferência pessoal pode variar entre monogamia e adultério. E Stálin mostra uma preferência pelo assassinato. Como diz Gardner Williams da Universidade de Toledo, em seu livro Humanistic Ethics: “A ambição egoísta ou vontade de poder, quando bem-sucedida, é intrinsecamente satisfatória” (p. 6). Assim, o assassinato, tanto quanto a amizade, é um valor porque foi descoberto como um valor na experiência. Como então uma teoria que se limita a fatos descritivos pode fornecer um fundamento para prescrições normativas? Se a premissa de um argumento é o fato descritivo de que alguém gosta de algo, por qual lógica se poderia chegar à conclusão de que outras pessoas deveriam gostar da mesma coisa? Qualquer silogismo que tenha uma conclusão normativa requer uma premissa normativa.
Alguns naturalistas, talvez a maioria dos naturalistas hoje, tentam contornar essa evidente falácia referindo-se à obrigação como uma exigência social. Em vez de depender do Deus Todo-Poderoso para impor sanções, esses naturalistas dependem da sociedade. Contudo, a tentativa de basear a moralidade na sociedade não só fracassa em evitar a falácia, como enfrenta outras dificuldades também. Em primeiro lugar, se a moralidade é uma demanda da sociedade, deve-se mostrar de qual sociedade. Ela é uma demanda da família, da igreja, da nação ou de toda a humanidade? Dificilmente pode ser de toda a humanidade, por duas razões. Não existem demandas que são claramente demandas da humanidade. A humanidade, se de fato fala, o faz numa linguagem tão indistinta e ambígua que nenhuma obrigação específica pode ser disso provada. E em segundo lugar, se a sociedade deve tomar o lugar de Deus como a fonte de sanções, então obviamente a humanidade não pode ser a base da obrigação, pois a humanidade não impõe sanções. Portanto, uma teoria ética baseada na demanda social deve apelar à família, igreja ou nação. Dessas três, a nação é a mais capaz de impor sanções. Por conseguinte, a moralidade se torna uma questão de lealdade ao Estado; e o assassinato, adultério e roubo se tornam obrigações morais quando o nazismo, fascismo e comunismo assim o exigirem.
Ademais, esse apelo à sociedade carece em si de uma base. Onde está o argumento para estabelecer a obrigação do indivíduo perante qualquer sociedade? Agir para evitar penalidades pode ser uma atitude prudente, mas até mesmo o Estado mais totalitário não é absolutamente eficiente. Assim, quando possível, a desobediência ao costume social ou mesmo a tentativa de subverter o Estado podem ser coisas justificadas. Em todo caso, um homem pode cometer suicídio. Como uma sociedade poderia obrigar um indivíduo a continuar vivendo? Dr. Jerome Nathanson, secretário executivo da Ethical Culture Society, percebendo que nem todo mundo se converterá ao Cristianismo, pede aos cristãos ortodoxos que submerjam sua fé e cooperem num empreendimento moral para salvar o mundo do seu problema atual. Quer se creia, quer não em Deus, ainda assim devemos seguir em frente e tentar fazer o mundo um lugar adequado para viver. Mas esse apelo comete uma petição de princípio grosseira. Na verdade, contém uma declaração obviamente falsa. Não é verdade que devemos seguir em frente e melhorar o mundo. Não precisamos continuar. Podemos renunciar ao mundo. É aqui que o dr. Nathanson fecha seus olhos para o problema. A vida vale a pena se Deus não existe? Ele acha que sim, mas o humanismo parece não ter nenhum argumento para apoiar essa crença. A pergunta ressurge, a saber, se Deus é banido, como a sociedade pode obrigar alguém a continuar vivendo? Essa questão parece irrespondível, e em vez de os cristãos serem demasiado educados para fazer perguntas embaraçosas, deveriam repetir essa pergunta insistentemente. Ademais, mesmo que uma pessoa não cometa suicídio, mas prefira viver, como a sociedade poderia obrigá-la a sacrificar o conforto dela em prol da melhoria do mundo? Se o naturalismo não pode fazer nada melhor que chamar essas pessoas de esponjas sociais e outros nomes depreciativos, como o faz W. H. Kilpatrick, ele abandonou a argumentação racional e não pode fornecer nenhuma base para a educação moral.
A despeito da especulação ética dos últimos cem anos, a melhor tentativa de basear a ética no empirismo, nas demandas sociais, nos bens individuais e em tudo o mais sem o benefício da revelação ainda é o utilitarismo de Jeremy Bentham. Ele pensava que, universalmente, todos os homens desejam o prazer. Essa afirmação de uma única finalidade comum coloca supostamente todos os homens debaixo de uma obrigação comum. Sobre essa base geral, o certo e o errado em circunstâncias específicas devem ser determinados pelo cálculo das consequências. Presumivelmente o assassinato, adultério e roubo seriam meios para a dor, e dessa forma a educação moral seria possível.
Infelizmente para o naturalismo, todas essas tentativas são fracassadas, pois não há nenhum conhecimento empírico que seja suficiente para estigmatizar o assassinato como algo errado e a propriedade privada como algo certo. Qualquer cálculo empírico para promover a boa vida em todas as pessoas afetadas pela conduta de alguém é um sonho em vão. Ainda que fosse verdade que o assassinato e o roubo frequentemente resultam em dor para o perpetrador, é claro que isso não é universalmente verdade. Hitler pode ter sofrido por seus assassinatos e confiscos: mas Stalin viveu até a idade avançada, gozando uma fruição quase perfeita dos seus planos vingativos. Poucos adeptos da moralidade bíblica podem se gabar de tal sucesso empírico. Na verdade, mesmo no caso de Hitler, incluindo sua catástrofe final, que argumento puramente naturalista poderia mostrar que a vida dele não foi melhor que a vida dos seis milhões de judeus que ele assassinou? Ele gozou de excitação, riqueza e poder por vários anos, e sofrimento por apenas alguns poucos momentos. Não seria essa uma vida melhor do que a das lamentáveis vítimas que ele fez? A menos que haja um Deus Todo-Poderoso para impor penalidades inescapáveis aos transgressores, por que não deveríamos louvar a vida rica, abastada, estimulante e perigosa de um ditador?
Qualquer teoria, portanto, que negue as sanções divinas mediante uma violação da lei divina não só fracassa em condenar o assassinato, adultério e roubo como também fracassa em estabelecer qualquer distinção universal ou comum entre o certo e o errado. O naturalismo, portanto, não pode servir de fundamento para a moral cristã nem tampouco de fundamento para a inculcação das preferências pessoais dos seus expoentes. Numa filosofia empírica e descritiva, pode-se encontrar o verbo ser; mas o verbo dever não tem nenhuma legitimidade lógica.
— Gordon H. Clark. Can Moral Education be Grounded on Naturalism? Bulletin of the Evangelical Theological Society I, n° 4 (outono de 1958), pp. 21–23. Tradução: Luan Tavares (05/07/2023).