Determinismo

O determinismo tem muitas formas. As três mais importantes são o determinismo físico, o determinismo lógico e o determinismo teológico.
O determinismo físico ou mecanicismo é aquele mais popularmente associado ao termo. Demócrito na antiguidade, além de Espinosa, Kant, La Place e em geral a ciência do século XIX, seguidos pelo behaviorismo no século XX, defendiam que todos os movimentos, incluindo os movimentos dos corpos humanos, podem ser descritos por equações diferenciais. Kant, que permitia uma liberdade no mundo noumenal, afirmava em termos claros que os homens no mundo visível, seguindo suas inclinações, não têm liberdade alguma. Como o determinismo é estritamente matemático, nenhuma declaração de propósito é possível. Espinosa acrescentou, embora isso não seja característico da maioria dos mecanicistas, que aquilo que não acontece é logicamente impossível.
A segunda forma é o determinismo lógico, do qual os antigos estoicos e os hegelianos do século XIX foram exemplos distintos. Eles não eram mecanicistas; acreditavam num propósito. E poderiam, portanto, ser chamados de deterministas racionais ou teleológicos. O Logos universal controla tudo que acontece; a Razão Absoluta se desdobra na história. O que quer que aconteça, deve acontecer; e, de forma mais coerente do que em Espinosa, o que não acontece é logicamente impossível. Os estoicos acrescentaram sua teoria de recorrência eterna.
Os estoicos também enfatizavam a ética e defendiam que a boa vida é uma vida de virtude. O determinismo mecanicista pode tornar a moralidade algo sem sentido (embora a grande obra de Espinosa traga o título Ética), mas o determinismo teleológico pode ser fortemente ético. Visto que o Logos estoico também é Deus, isso fornece uma transição para a terceira forma de determinismo, o determinismo teológico, isto é, Deus pré-ordena o que quer que venha a acontecer. Note aqui que. segundo Flávio Josefo (Antiquities of the Jews, XVIII.i.3),¹ enquanto os saduceus libertinos acreditavam no livre-arbítrio, os fariseus meticulosos e os essênios rigorosos eram deterministas: “Os fariseus… vivem torpemente e desprezam as iguarias da dieta, seguindo a conduta da razão… e quando determinam que todas as coisas são feitas pelo destino, não subtraem dos homens a liberdade de agirem como estes julgam adequado; já que a noção deles é que agradou a Deus fazer um temperamento segundo o qual o que ele quer é feito, mas para que a vontade do homem possa agir virtuosa ou perversamente”.
O romanismo se atém ao livre-arbítrio, e Erasmo fez disso seu principal argumento contra Lutero, que deu uma resposta na sua obra-prima Da vontade cativa. Melâncton, neste e em muitos outros pontos, repudiou Lutero. Calvino, Knox, os artigos religiosos irlandeses, a Confissão de fé de Westminster e a posição reformada como um todo eram totalmente deterministas. Armínio, no começo do século XVII, repudiou a fé reformada e recuou para o romanismo.²
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¹ Edição brasileira: História dos hebreus. De Abraão à queda de Jerusalém (Rio de Janeiro: CPAD, 2004).
² Este artigo do dr. Clark foi originalmente publicado em Baker’s Dictionary of Christian Ethics, Carl F. H. Henry, editor. Grand Rapids, Michigan: Baker Book House, 1973, p. 177–178.
CLARK, Gordon H. Ensaios sobre Ética e Política. Brasília, DF: Editora Monergismo, 2018, pp. 65–66.