Responsabilidade

“Ensaios sobre Ética e Política”, de Gordon H. Clark.

Gordon H. Clark
3 min readJun 10, 2020
Pilate Washing his Hands, 1615–1628, Hendrick Terbrugghen.

Responsabilidade e moralidade são coisas inseparáveis. Uma não pode existir sem a outra. Uma filosofia mecanicista ou behaviorista não tem lugar nem para uma, nem para outra. Outros filósofos diferem entre si quanto à base ou natureza da obrigação.

Platão encontrou a responsabilidade em um Mundo de Ideias suprassensorial e supratemporal; Aristóteles, na natureza do homem; Kant, na força da lógica. Fichte fez da obrigação um dado original. O cristianismo, claro, baseia a responsabilidade na imposição dos mandamentos do Criador.

Escritores de ética costumam dedicar mais tempo ao grau da responsabilidade. Provavelmente, existe um consenso universal de que o homem não é responsável por ações involuntárias: se um homem é atropelado por um carro, não é responsável pela queda. Soa trivial? Não é tão trivial quando um homem é tomado de insanidade, incendeia sua casa e mata seus filhos.

Os estoicos enfatizavam muito a volição; mas foi Aristóteles quem melhor enumerou os detalhes. Ele examina as ações feitas através do medo. O que dizer, então, das ações feitas sob a “compulsão” do prazer? Que tal a embriaguez? Algumas ações são feitas por ignorância. Há vários tipos de ignorância. Um homem pode ser ignorante de quem ele mesmo é (ele pensa ser Napoleão ou Cristo); pode não saber o que está fazendo (“Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”); pode não conhecer a pessoa sobre quem finalmente recai seu ato (confundir um amigo como inimigo); pode não conhecer o instrumento (a arma que “não estava carregada”); pode não saber a maneira de executar o ato (pretende apertar sua mão cordialmente, e quase quebra suas articulações). A ignorância em qualquer desses casos específicos isenta a pessoa de responsabilidade. Aristóteles continua com outros detalhes.

A Bíblia não dá nenhum relato sistemático desses assuntos, mas tanto na lei mosaica (por ex., as cidades de refúgio) como no Novo Testamento ocorrem exemplos. 1 Timóteo 1.13 diz: “noutro tempo, era blasfemo, e perseguidor, e insolente. Mas obtive misericórdia, pois o fiz na ignorância, na incredulidade”. Além de casos específicos, ocorrem declarações gerais em Lucas 12.45–48 e João 15.22; mas particularmente em Romanos 1.32: “Ora, conhecendo eles a sentença de Deus, de que são passiveis de morte os que tais coisas praticam, não somente as fazem, mas também aprovam os que procedem”.

Essa última referência atende à objeção de que os pagãos não são responsáveis porque jamais ouviram o evangelho. Eles são responsáveis, pois conhecem a lei. “Quando, pois, os gentios, que não têm lei [mosaica], procedem, por natureza, de conformidade com a lei, não tendo lei [mosaica], servem eles de lei para si mesmos. Estes mostram a norma da lei gravada no seu coração…” (Rm 2.14–15). Portanto, a responsabilidade é estabelecida e limitada pelo conhecimento.

Teólogos e pregadores populares que não se importam em enfatizar o conhecimento tentam, às vezes, basear a responsabilidade no livre-arbítrio. Mas além do fato de que Escritura não ensina isso, um arbítrio livre e independente do conhecimento, do próprio caráter e do caráter de Deus, fornece um fundamento pobre para a moralidade.¹
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¹ Este artigo do dr. Clark foi originalmente publicado em Baker’s Dictionary of Christian Ethics, Carl F. H. Henry, editor. Grand Rapids, Michigan: Baker Book House, 1973.

— Gordon H. Clark. Ensaios sobre Ética e Política. Brasília, DF: Editora Monergismo, 2018, pp. 279–281.

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Gordon H. Clark
Gordon H. Clark

Written by Gordon H. Clark

Gordon Haddon Clark (1902–1985) foi um teólogo, filósofo e apologista pressuposicional. “Santifica-os na verdade; a tua palavra é a verdade.” (João 17:17)

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