Os Problemas do Empirismo
W. Gary Crampton

O empirismo, em contraste com o racionalismo, mantém que todo conhecimento se origina nos sentidos. Ele alega contar com um mundo objetivo externo ao observador. A experiência ordinária transmite conhecimento, de acordo com o empirista. Com certeza, o método científico de investigação é a síntese da epistemologia empírica, e os triunfos da ciência na era moderna demonstram a verdade do empirismo, ou assim declaram os empiristas. A ciência se baseia na observação; a ideia é: sendo algum fenômeno observável, então ele deve ser conhecido. Sem dúvida, a ciência enfatiza a observação repetitiva. Com a repetição, o conhecimento e a certeza são aumentados.
Aqui, como no racionalismo, dizia o dr. Clark, há a “razão sem fé”. Mas no empirismo, “razão” toma um significado diferente. No racionalismo, “razão” significa lógica, ou pelo menos ideias apriorísticas, e se faz a tentativa de basear o conhecimento nessas teses obtidas sem a assistência da revelação ou sensação. Já no empirismo, a “razão” significa sensação, pois a mente é uma tabula rasa (“tábua raspada”) no nascimento;⁸ ela não tem nenhuma estrutura, forma ou ideias; assim, todo o conhecimento deve advir dos sentidos.⁹
Embora os racionalistas procedam por dedução, o raciocínio usado no empirismo é indutivo também. Uma pessoa coleta experiências e observações e traça inferências e conclusões. Esse conhecimento empírico é a posteriori, isto é segue-se à experiência. A pessoa deve ser capaz de cheirar, provar, sentir, ouvir ou ver algo para conhecer. Tão logo ocorra a experiência, a mente — uma tabula rasa antes do experiência — pode de alguma forma lembrar-se de imaginar, combinar, transpor, categorizar e formular as experiências sensoriais para obter o conhecimento.
Há vários problemas com o empirismo, demais para listá-los neste livro. Por exemplo, todos os argumentos indutivos são falácias formais de lógica. Cada argumento começa com premissas particulares e termina com uma conclusão universal. Não é possível coletar experiências suficientes sobre qualquer assunto para alcançar uma conclusão universal. Pelo fato de esse sistema depender da coleção de observações para derivar conclusões, ele nunca pode ter certeza de que alguma nova observação não mudará por completo as conclusões anteriores. Assim, jamais poderá ser conclusivo. Suas conclusões sempre devem ser consideradas tentativas e sujeitas à revisão. Se alguém duvida disso, tenha em mente que os cientistas estão continuamente revisando e mudando suas conclusões anteriores.¹⁰
Afirmando que a ciência não deve ser considerada um corpo de verdade, o dr. Clark cita Einstein: “Nós [cientistas] definitivamente não sabemos nada sobre ela [“natureza”]. Nosso conhecimento é apenas o conhecimento da criança da escola… Saberemos um pouco mais do que sabemos agora. Mas a natureza real das coisas — essa nunca saberemos, nunca”.¹¹
A abordagem indutiva acerca do conhecimento exige a atuação sem quaisquer suposições antecipadas com respeito aos resultados das investigações. Isso não é possível. Nenhum cientista realiza um experimento exceto para testar uma teoria — a teoria é uma das suas suposições.¹² Mesmo sendo verdade, disse o dr. Clark, que a ressurreição de Jesus Cristo “é o acontecimento mais bem autenticado da história antiga” pelos padrões dos próprios historiadores seculares, a grande maioria dos historiadores seculares continuaria “a rejeitar a ressurreição […] pela pressuposição teológica de que Deus não pode ressuscitar os mortos”.¹³
Além do mais, escreveu o dr. Clark, mesmo “que a pesquisa histórica pudesse provar que Jesus realmente ressuscitou (e na opinião do autor [de Clark], a pesquisa histórica nunca prova nenhum acontecimento…), isso ainda não provaria a divindade de Cristo (pois Lázaro também ressuscitou dos mortos)… A pesquisa nunca produz a fé cristã; ela [fé] é o dom de Deus”.¹⁴
Outro problema com o empirismo é que não raro os sentidos podem, talvez com certa constância, nos enganar. Quem já esteve em um cinema pode atestá-lo, pois no cinema algo parece atravessar a tela, mas nada se move.
Nesse sistema, a verificação, ou seja, a inferência da conclusão decorrente de uma consequência boa e necessária, não é possível. De fato, o próprio axioma básico do empirismo — a necessidade de provar ou reprovar todas as coisas mediante a observação sensorial — não pode ser verificado pela observação sensorial. Assim, o empirismo descansa sobre um ponto de partida autocontraditório e, portanto, falso.
Além disso, as verdades da matemática podem ser derivadas da experiência? As leis da lógica podem ser abstraídas ou obtidas de impressões sensoriais? Há dificuldades insuperáveis para a epistemologia empirista.¹⁵ O empirismo não pode dizer como apenas os sentidos fornecem conceitos. Caso o “conhecedor” não seja alguém equipado com elementos ou ideias conceituais, como poderá alguma vez conceituar o objeto sentido? O racionalismo, com suas ideias universais, apresenta uma explicação de suas categorias e similaridades, mas o empirismo não. E sem isso, o discurso racional seria impossível.
O solipsismo é inescapável na epistemologia empirista. As sensações pessoais são apenas isso: as sensações de uma pessoa. Ninguém mais pode experimentá-las. Porém, sendo esse o caso, como alguém pode saber que há um mundo externo? Qualquer evidência que se ofereça será apenas outra sensação subjetiva. No empirismo, eu poderia ser uma das dores de cabeça de uma pessoa.
Na ética, mesmo que se adote o empirismo, na melhor das hipóteses ele pode dizer o que é, mas nunca dirá o que deve ser. Os cientistas, por exemplo, podem inventar lasers, mas a ciência não pode dizer como, ou se devem ser usados. A ciência também forneceu a bomba atômica, mas não é capaz de prescrever seu uso apropriado. Como o dr. Clark escreveu: “Na filosofia empírica e descritiva, pode-se encontrar a flexão verbal é; mas a flexão verbal deve não tem posição lógica”.¹⁶ De que modo argumentos derivados de observações empíricas poderiam render princípios morais? Come alguém poderia mostrar, de forma empírica, que o incesto é pecado, como o diz Levítico 18? “Um princípio moral”, declarou o dr. Clark, “só pode ser uma proibição ou um mandamento revelado por Deus”.¹⁷
Por fim, como os sentidos fornecem conceitos semelhantes a “paralelo”, “igual” ou “justificação”? Essas palavras jamais se encontram na experiência sensorial. Nem duas coisas experimentadas são perfeitamente iguais. Como David Hume (1711–1776) afirmou dois séculos atrás, e assim ensinou o dr. Clark, se alguém deriva sua posição epistemológica da sensação, jamais poderá saber nada.¹⁸
Paulo escreveu em 1 Coríntios 2.9, 10: “Mas, como está escrito: O que o olho não viu, nem o ouvido ouviu, nem jamais penetrou na mente do homem, as coisas que Deus preparou para aqueles que o amam, para nós Deus as revelou através do Espírito” (tradução do dr. Clark). Aqui, condensando duas passagens de Isaías, o dr. Clark disse: “Paulo reforça a distinção entre a religião empírica e a religião revelada… Deus revela o que o homem não pode conhecer de outra forma”. Em outras palavras, o estudo empírico nunca pode outorgar a verdade.¹⁹ A revelação proposicional é o sine qua non do conhecimento. Mesmo antes da Queda, o homem era dependente da revelação proposicional para obter conhecimento. Ele não poderia, pela observação, determinar onde estava, quem era, ou o que deveria fazer. O dever de Adão, disse o dr. Clark, “foi imposto sobre ele por uma revelação divina especial”.²⁰ Deus teve que revelar informação para ele, e a presente situação, agravada pelo pecado, tornou a necessidade de revelação ainda maior.²¹
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⁸ Esta expressão latina equivale ao conceito de uma “folha de papel em branco” em português. [N. do R.]
⁹ Religion, Reason and Revelation, p. 54ss; Lectures on Apologetics, The Trinity Foundation, 1981, fitas 5–7.
¹⁰ The Trinity, p. 92–3.
¹¹ First Corinthians, p. 128.
¹² The Philosophy of Science and Belief in God, p. 96ss.
¹³ First Corinthians, p. 254–5.
¹⁴ First Corinthians, p. 255.
¹⁵ A Christian View of Man and Things, p. 108.
¹⁶ Essays on Ethics and Politics, p. 10.
¹⁷ First Corinthians, p. 78.
¹⁸ Three Types of Religious Philosophy, p. 59ss; Thales to Dewey, p. 278–84; Lectures on Apologetics, fitas 8, 9. Acerca da refutação completa do behaviorismo, uma forma moderna de empirismo mecanismo, naturalismo etc., cf. Behaviorism and Christianity.
¹⁹ First Corinthians, p. 37.
²⁰ God’s Hammer, p. 66–7.
²¹ Ambitious to Be Well Pleasing, editado por A. C. Guelzo, p. 127–33.
— W. Gary Crampton. O Escrituralismo de Gordon Clark. Brasília, DF: Editora Monergismo, 2012, p 24–29.
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